
Faixas de APP em Áreas Urbanas: o que está em discussão no STF com a ADI 7146?
Faixas de APP em Áreas Urbanas: o que está em discussão no STF com a ADI 7146?
Em 2021, foi sancionada a Lei nº 14.285, que alterou o Código Florestal para permitir que os municípios brasileiros estabeleçam, por meio de legislação local, as faixas de proteção às margens de rios e córregos situados em áreas urbanas consolidadas.
Na prática, a norma autorizou que as prefeituras reduzam a faixa mínima de 30 metros de preservação que antes era exigida para qualquer curso d’água, mesmo dentro das cidades. A justificativa do legislador foi dar mais autonomia aos municípios para lidar com a realidade das áreas já ocupadas, facilitando regularizações fundiárias e projetos urbanísticos.
Mas a mudança não passou despercebida. Ainda no mesmo ano, quatro partidos políticos (PSOL, PT, PSB e Rede Sustentabilidade) ajuizaram a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 7.146, questionando a validade da nova lei perante o Supremo Tribunal Federal (STF).
O que diz a ação?
Segundo os autores da ADI, a Lei nº 14.285/2021 viola a Constituição Federal por vários motivos. O primeiro argumento é ambiental: permitir que municípios reduzam unilateralmente a faixa de APP traria um grave risco de retrocesso ecológico. Isso porque as áreas marginais de rios cumprem papel fundamental na proteção do solo, na prevenção de enchentes e na adaptação das cidades às mudanças climáticas.
O segundo ponto é jurídico. De acordo com a Constituição, a União é quem deve legislar sobre normas gerais de proteção ambiental. Os partidos sustentam que a nova lei quebra essa lógica e dá aos municípios uma competência que não lhes pertence integralmente. Isso comprometeria o equilíbrio federativo e enfraqueceria a política nacional de meio ambiente.
Além disso, a ADI argumenta que a possibilidade de cada município definir regras próprias para APPs pode gerar insegurança jurídica, dificultando a atuação dos órgãos ambientais e abrindo margem para decisões casuísticas, muitas vezes orientadas por pressões locais.
Em que pé está o julgamento?
A ADI 7146 está sob a relatoria do ministro André Mendonça, mas ainda não houve julgamento de mérito. Também não foi apreciado o pedido de medida cautelar, feito logo no início da ação, para suspender temporariamente os efeitos da lei.
O processo está em fase de instrução. Diversas entidades ambientais e técnicas ingressaram como amicus curiae para reforçar a importância do tema. Entre elas, estão organizações como a Abrampa, o WWF, o Observatório do Clima e a SOS Mata Atlântica.
Nos últimos anos, especialmente após tragédias causadas por chuvas intensas em cidades como São Sebastião e Petrópolis, cresceu a pressão para que o STF se manifeste. Muitos especialistas apontam que a ocupação desordenada em áreas de risco, muitas delas em APPs, é diretamente responsável pelo agravamento dos danos nesses eventos extremos.
O que pode mudar?
Por enquanto, a Lei nº 14.285/2021 continua valendo. Isso significa que os municípios ainda podem editar leis locais reduzindo a largura das faixas de proteção ambiental nas áreas urbanas consolidadas. No entanto, essa aplicação está sendo feita com cautela, justamente porque sua constitucionalidade está sendo questionada.
A depender da decisão do STF, toda e qualquer norma municipal baseada nessa lei poderá ser anulada. Isso impactaria não só futuras ocupações, mas também loteamentos, construções e regularizações fundiárias que tenham se apoiado na nova regra.
Por que esse tema importa?
A discussão sobre as APPs urbanas vai muito além de uma disputa técnica sobre competências legislativas. Ela envolve o modelo de cidade que queremos construir. O que está em jogo é a capacidade do Estado, em todos os níveis, de prevenir desastres, proteger o meio ambiente e oferecer segurança jurídica a quem constrói e a quem vive nas áreas urbanas.
O julgamento da ADI 7146 será decisivo para definir os limites da autonomia municipal em matéria ambiental e estabelecer até que ponto é possível flexibilizar regras de proteção em nome do desenvolvimento urbano. Enquanto isso, prefeituras, promotores, urbanistas, advogados e a própria população devem acompanhar de perto essa pauta, que certamente terá reflexos práticos em milhares de municípios pelo país.